13 janeiro 2010

O Pro-Leitura

O ano acabou e só agora começamos a nos dar conta do que o governo aprontou durante o mês de dezembro. Como todos sabem, dezembro é o mês de recesso dos parlamentares, mas isso não impediu que o ministro da cultura, Jucá Ferreira, se aboletasse no senado federal munido de um projeto de lei que visa dar ainda mais poder ao governo federal. O recesso também não impediu a feitura de mais um projeto destinado a surrupiar parte do dinheiro dos impostos. Refiro-me ao Fundo Pro-Leitura. Vejamos o que está escrito na minuta do projeto de lei: "institui o Fundo Setorial do Livro, Leitura e Literatura - Fundo Pro-Leitura, cria a Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico do Fundo Pro-Leitura e da outras providências".

A forma jurídica para a criação da receita é instituir uma Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico (CIDE) sobre o faturamento das editoras de livros. A brincadeira, se aprovada, vai gerar R$ 57 milhões de reais por ano, para que burocratas dedicados à causa da leitura possam dispor, ao seu arbítrio, dos recursos. Devemos lembrar que os impostos sobre as vendas são regressivo, concentradores de renda e normalmente, geram um nefasto efeito em cascata. Eles empobrecem não apenas os produtores (os editores), mas também o consumidor, que terá que arcar com o ônus desse absurdo jurídico. Cálculos mostram que um tributo de 1% sobre o faturamento se transforma em arrecadação de 2,1% graças ao maravilhoso efeito cascata. Vai ver é por isso que projetos como esse são sempre apresentados na surdina!

É sabido que o setor editorial vem amargando uma queda sucessiva na quantidade de exemplares vendidos, desde 1998. Da mesma forma, a receita real do setor também involiu. Instituir um imposto sobre uma atividade em crise é um contra-senso, um absurdo. Não é de hoje que as editoras vivem as turras com outras formas de transmissão de conhecimento, como o Kindle e a tecnologia que permite compactar livros e revistas em formato PDF. Com a criação de um novo imposto, esse processo vai se agravar ainda mais.

Argumentar que o setor foi desonerado do PIS/COFINS e que, portanto, poderia arcar com o ônus é uma tese absurda. Constitucionalmente a atividade editorial tem imunidade tributária e a cobrança do PIS/COFINS não passava de uma afronta à ordem constitucional. As contribuições nunca foram devidas pelo setor editorial. Fazer da nova CIDE uma contrapartida da suposta bondade pelo cumprimento da imunidade tributária é má fé. Não houve bondade alguma, apenas a correção de uma flagrante injustiça, revestida de total ilegalidade.

A posição conciliadora da vontade do governo com os interesses dos editores foi expressa por Sonia Machado Jardim, em artigo assinado no Estadão, publicado no dia 23 de julho do ano passado. Sonia é a presidente do SNEL – Sindicato Nacional do Editores de Livros. Sua proposta é simples: para a criação do Fundo, que se ponha contrapartida equivalente de recursos pelo governo. É claro que não elide o fato de que o setor está sendo roubado, mas ao menos dá uma satisfação aos que fazem parte do setor, manifestando no gesto o engajamento dos burocratas governamentais com a nobre causa do livro.

É difícil hoje em dia um sindicato patronal se colocar de forma contrária a uma vontade governamental. O poder de Estado pode ser esmagador. Então é preciso compreender o conformismo do SNEL diante da iminente injustiça; é como um refém diante do seu algoz. Evidentemente que a disposição do governo de colocar recursos orçamentários no Fundo é nula e a tramitação do projeto de lei deve ignorar solenemente o pensamento dos produtores de livros. Um pesadelo e tanto para as editoras, livrarias e consumidores.

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