30 setembro 2009

Crônica de uma tragédia anunciada

Diante da rejeição praticamente unânime ao decreto que estabeleceu o estado de defesa em Honduras, o governo Micheletti engatou marcha-a-ré e disse que a medida pode ser suspensa nos próximos dias.

Quanto ao ultimato dado ao governo Lula para que defina a situação de Zelaya (dez dias, que se esgotam na próxima terça), não houve nenhum recuo: os comunicados oficiais feitos pelas rádios ao longo do dia de ontem se referiam à embaixada brasileira como "o local que abrigava a missão diplomática" do Brasil. Na prática, o governo Micheletti já retirou o status diplomático da embaixada, o prazo de dez dias é mera formalidade. Findo o prazo, o Itamaraty pretende trazer os funcionários para o Brasil, deixando lá apenas um mordomo ou pajem - como preferirem - para Manuel Zelaya.

Essa certamente será uma missão pra lá de ingrata, pois o nosso "hóspede" é um maluco clínico que transformou a embaixada brasileira em uma espécie de Stalingrado bananeira. Da última vez que Zelaya conclamou os seus seguidores para a resistência, o governo Micheletti institui o estado de defesa e restringiu severamente a liberdade de expressão... O que virá agora? A recusa de Zelaya em atender aos apelos do Itamaraty é natural e até previsível, visto que ele ignorou as recomendações do presidente Lula mais de uma vez e não aconteceu absolutamente nada! O ministro Celso "não há o que fazer" Amorim, está convicto que o melhor a fazer em um caso como este é fingir que não é conosco.

Enquanto ninguém toma providências em relação ao comportamento do arruaceiro Manoel Zelaya, ele continua utilizando a missão diplomática brasileira como o seu bunker particular. Recentemente ele convocou uma coletiva de imprensa e deu vazão a todos os seus delírios: voltou a falar na iminência de uma invasão militar à missão diplomática e disse que a crise hondurenha já produziu "uma centena de mortos", embora "eles contabilizem só dez" (foram três as vítimas dos confrontos entre a polícia e os zelaystas).

Dois fatores podem estar contribuindo para as alucinações do hondurenho: o cansaço (hoje à tarde, Zelaya filho não agüentou e pediu para sair, junto com a namorada – dos membros da família, resta agora apenas Xiomara Zelaya, que faz aniversário amanhã) e a qualidade das leituras do presidente deposto.

Prova de que só pensa naquilo, Zelaya está lendo "El Candidato", do argentino Jorge Bucay, autor de obras como "Vinte Passos para a Felicidade" e "Amar de Olhos Abertos". "El Candidato" é seu primeiro título de ficção. A resenha descreve assim a mirabolante trama que anda embalando as noites de Zelaya: um certo coronel que, por décadas, comanda com mão-de-ferro uma obscura república resolve, de uma hora para outra, convocar eleições democráticas. A população fica radiante de felicidade, mas eis que essa alegria é interrompida por uma série de assassinatos misteriosos que um psicólogo forense, sua namorada jornalista e um cientista tentarão solucionar, correndo assim enormes riscos de vida. Típico...

* O título deste artigo alude a obra de Gabriel García Marquez, "Crônica de uma tragédia anunciada".

Nenhum comentário: