Os sem-terra vendem a si mesmos como promotores deste famoso "bem comum", uma expressão que, historicamente, costuma servir como apanágio para os piores tipos de crimes e criminosos. O Brasil é um país onde o liberalismo tem raízes superficiais, quase sempre fincadas em solo arenoso. Mesmo os partidos e agremiações que se colocam mais à direita no espectro político têm grandes dificuldades de imaginarem a si e a seus propósitos sem o concurso da máquina estatal.
Os tempos são um tanto rombudos para tocar em palavras como "liberalismo" porque as esquerdas logo sacam da cintura o prefixo "neo", usado como uma pistola, para assaltar a razão e a verdade... Coisa em que os movimentos de esquerda já se tornaram especialistas. Basta que alguém cite as palavras de homens como Mises ou Hayek para que os socialistas gritem: "Mãos ao alto, liberal! Nós estamos com tudo. Nós, os estatistas, contornamos a crise". É mesmo? Conversa! E o fizeram com os recursos gerados pelo Estado ou pelo mercado? É preciso dizer aos vigaristas que o capitalismo salvou o capitalismo, como sempre aconteceu. Mas, durante algum tempo, será preciso atravessar o deserto. E vamos atravessar. Faz parte do jogo.
A disputa de fundo da CPI é aquela existente entre os chamados "direitos coletivos" — ou o tal "bem comum" — e os "direitos individuais". Para que fique mais claro, gostaria de traduzir um parágrafo do ensaio What Is Capitalism, da brilhante Ayn Rand, uma liberal convicta, radical, de raízes solidamente fincadas em solo fértil, que está no livro Capitalism - The Unknown Ideal.
Quando, numa sociedade, o "bem comum" é considerado algo à parte e acima do bem individual, de cada um de seus membros, isso significa que o bem de alguns homens tem precedência sobre o bem de outros, que são relegados, então, à condição de animais prontos para o sacrifício. Presume-se, nesse caso, implicitamente, que o "bem comum" significa o "bem da maioria" tomado como algo contrário à minoria ou ao indivíduo. Observe-se ser esta uma suposição implícita, já que até mesmo as mentalidades mais coletivistas parecem perceber a impossibilidade de justificá-la moralmente. Mas o "bem da maioria" é nada mais do que uma farsa e uma fraude: porque, de fato, a violação dos direitos de um indivíduo significa a abolição de todos os direitos. Isso submete a maioria desamparada ao poder de qualquer gangue que se autoproclame a "voz da sociedade", que passa a subjugá-la por meio da força física, até ser deposta por outra gangue que empregue os mesmos métodos.
É isso aí. Reitere-se: trata-se do "bem da maioria" que só se define como algo "contrário à minoria ou ao indivíduo". Sempre que esta contradição estiver estabelecida — ou, mais do que uma contradição, sempre que o "bem comum" for visto como algo que casse os direitos individuais ou que sacrifique o indivíduo em nome do coletivo —, estamos, certamente, diante de uma fraude, de uma mistificação, da justificação do crime. E a sociedade termina, então, refém das tais gangues, que tomam para si o papel de justiceiras sociais. Se o fazem num estado democrático e de direito, só podem fazê-lo ao arrepio da lei; se o fazem numa sociedade mobilizada por demagogos comuno-fascistas, tornam-se braços do mandatário, suas milícias ou falanges.
Voltaremos muitas vezes a este tema. Mas o debate real, de fundo, é este que sintetizo aqui. A nossa tarefa é justamente denunciar e desmoralizar as gangues que falam em nome deste "bem comum" que se oporia aos direitos individuais — entre eles, é evidente, o direito à propriedade. Supor que este debate já está superado corresponde a subordinar-se à pregação das gangues.
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