Mas não é sobre isso que eu quero falar. Recentemente, Sanchez afirmou em uma entrevista à BBC Mundo, que no último dia 6 de novembro ela foi detida durante quase meia hora e espancada por um grupo de homens que tentavam impedir que ela chegasse a uma manifestação pública. No blog, ela acusou autoridades de segurança que a teriam espancado por criticar o governo de Raúl Castro.
De acordo com o correspondente da BBC em Cuba, George Ballantine, os blogueiros cubanos "estão promovendo debate longe da doutrina oficial para explorar assuntos sociais e econômicos". "Sem dúvida, a atual tolerância do governo poderia mudar, na medida em que cresce o número de blogueiros que estão começando a condenar a perseguição aos escritores independentes e a exigir reformas estruturais", afirmou.
Essa semana o site Notalatina voltou a falar da ilha comandada pelo ditador Raul Castro e do sofrimento que é imposto aos seus dissidentes. Quando li a notícia, acreditei que se tratase de mais uma nota a respeito da prisão da blogueira Yoani Sanchez, mas não. A matéria falava sobre a ilustre economista Martha Beatriz Roque cabello e outros nove jornalistas independentes.
Martha Beatriz é uma economista cubana, fundadora do Instituto de Economistas Independentes de Cuba e líder da Assembléia para Promover a Sociedade Civil. Martha foi presa pela segunda vez durante a "Primavera Negra de Cuba", em março de 2003, sendo a única mulher condenada a 20 anos de prisão e confinada à Prisão de Mulheres "Manto Negro" em Havana. Pode-se ler a súmula do processo condenatório aqui. Insisto para que leiam, pois todos devem conhecer os "argumentos" utilizados para condená-la e o material de sua propriedade confiscado dentro de sua residência, tidos como "peças do crime".
Chamo a atenção, também, para este trecho do processo que informa acerca de sua testemunha de acusação (textualmente):
"...conclusões que coincidem plenamente com o expressado no relato fático e na declaração de Aleida de las Mercedes Godinez que foi agente secreta do Departamento de Segurança do Estado infiltrada como funcionária do Escritório de Estatísticas do chamado Instituto de Economistas Independentes de Cuba e da Assembléia para promover a Sociedade Civil em Cuba".Esta agente trabalhou no instituto dirigido por Martha Beatriz durante 13 anos como secretária, ouvindo conversas íntimas e confidenciais e retransmitindo para o órgão represor. Como ela existem incontáveis outros agentes, se passando por dissidentes, falando a mesma linguagem, fazendo as mesmas críticas e queixumes, até a hora do bote final. Qualquer semelhança com o que aconteceu durante o Desabrochar das Cem Flores, na China de Mao Tse, não é mera coencidência.
Depois de meses sem receber assistência médica para seus problemas de saúde, incluindo tonturas, paralisia do lado esquerdo do corpo, dores no peito, desorientação, vômitos, diarréia e sangramentos pelo nariz, e graças à pressão internacional, Martha foi finalmente transferida para o Hospital Militar Carlos J. Finaly em Havana, em agosto de 2003, onde foi diagnosticada com diabetes e outros problemas graves. Diante do debilitamento de sua saúde, Martha foi excarcerada em 22 de julho de 2004. Hoje Martha vive com uma "licença extra-penal por motivos de saúde", como outros tantos presos-políticos que foram libertados da prisão em circunstâncias semelhantes.
Já em sua casa, Martha resolveu criar um blog para publicar todo tipo de informação, artigos, denúncias e reflexões. O endereço do blog é este: http://marthabeatrizinfo.blogspot.com/. Graças a essa "liberdade", Martha criou a Rede Cubana de Comunicadores Comunitários, cujos jornalistas reportam os problemas pelos quais atravessam os cidadãos cubanos que não têm uma atividade político-partidária a favor ou contra o regime, mas que padecem os abusos ou a perseguição das autoridades. O trabalho da Rede é reportado para um blog que foi adquirindo prestígio e, ao mesmo tempo, granjeando o ódio e a perseguição por parte do regime.
Desde o dia 10 de outubro, Martha e outros nove jornalistas cubanos encontram-se privados da liberdade, cercados pela polícia política na casa de Vladimiro Roca Antúnez em Havana.
O conflito começou com ameaças de um oficial da Segurança a Martha e com o confisco da máquina fotográfica de um dos jornalistas da entidade, alegando que não devolveriam seu equipamento porque iam realizar "uma perícia", pois havia mais duas fotos além das que ele havia declarado. Que delito monumental! No dia seguinte, os onze se reuniram na casa de Vladimiro Roca para protestar contra essa flagrante violação da liberdade de expressão. Eram apenas 11 pessoas desarmadas e pacíficas exigindo que uma máquina fotográfica fosse devolvida a seu proprietário. A casa foi imediatamente cercada pela Segurança do Estado que interceptou ao menos 36 pessoas que se dirigiam para lá para se solidarizar com eles. Grupos dissidentes de toda a Ilha apoiaram o protesto, mas isto não é do interesse da mídia brasileira, afinal, Martha Beatriz não tem um Franklin Martins à sua disposição.
Outros fatos degradantes seguiram-se a esse acosso. Os familiares dos jornalistas foram procurados pela polícia política para obrigá-los a pressionar os manifestantes a "desistir de sua posição". A filha da jornalista Niurka de la Caridad Ortega Cruz, de 15 anos, foi expulsa do colégio por causa das atividades de sua mãe e a filha de Elizabeth de Regla Alfonso Castellanos foi interrogada na rua pela polícia. Durante cinco dias a polícia usou alguns estudantes de uma escola primária e de uma secundária básica próximas da casa, para que fustigassem os jornalistas insultando-os, jogando pedras e fazendo gestos obscenos com as calças abaixadas. Outros estudantes passaram correndo pela frente da casa, com medo de serem agredidos, pois a polícia lhes disse que aquelas pessoas eram, na verdade, terroristas.
No dia 14, quando Vladimiro saiu para conseguir alguma comida para o grupo que se encontrava retido em sua casa, foi novamente agredido pelos policiais e um homem disse que ele seria apunhalado. O "terrorismo" que esses onze opositores praticavam se resumia aos cartazes que eles seguravam na frente da casa com os seguintes dizeres: "SOMOS CUBANOS. EXIGIMOS NOSSOS DIREITOS"; "O POVO NECESSITA O QUE LHE PROMETERAM"; "NÃO DIREITOS - NÃO PESSOAS"; "LIBERDADE, LIBERDADE, LIBERDADE" e "VAMOS RESISTIR".
Em um comunicado emitido à comunidade internacional o grupo faz um chamado para a grave situação em que estes dissidentes se encontram. Nele, além do que já foi relatado acima, eles denunciam que esses "Mitines de Repúdio" chegaram a durar até 7 horas diárias e que foram trazidas pessoas até de ônibus para pressioná-los e intimidá-los. Grupos que chegaram a ter até 200 pessoas, utilizavam-se de crianças para proferir palavras e gestos obscenos, ameaças verbais, jogaram ovos, paus, pedras, preservativos cheios de líquido. Nesta turba encontram-se vários oficiais da Segurança do Estado, não só instigando mas também participando das agressões.
Há 25 dias este grupo permanece protestando pelos direitos mais elementares de todos os cubanos - e não apenas de si próprios - mas estão ameaçados de não poder sair da casa para comprar comida porque são agredidos a pedradas na rua. A luz, o gás e a eletricidade foram cortados. Fotos deste episódio degradante que, se me permitem dizer, ainda não acabou, podem ser vistas aqui.
No dia 10 de novembro os membros da Rede Cubana de Comunicadores Comunitários resolveram fazer uma grave de fome e emitiram um comunicado onde responsabilizam o Estado cubano pelo que possa acontecer às suas vidas. Martha Beatriz é diabética e está em jejum (bebendo apenas água). O marido de uma das jornalistas é medico e a examinou, dizendo que apesar dos desmaios e da fraqueza que a mantém na cama, seu quadro é "clinicamente estável mas que essa estabilidade poderia mudar e, além disso, não se podia fazer provas laboratoriais para medir o nível de açúcar no sangue". O padre de sua paróquia foi chamado e lhe deu a Extrema Unção, pois não se sabe até onde esta guerreira vai resistir. Esperemos que a imprensa internacional dê a ela o mesmo destaque que vem dando ao terrorista Cesare Bastisti; esse sim um criminoso costumaz.
Fico triste em saber que apesar deste fato ter sido divulgado pelo jornal "El Nuevo Herald", não se ouve uma mísera palavra de apoio dos grupos de "direitos humanos"; da "Anistia Internacional" ou da CIDH (Comissão Internacional de Direitos Humanos) que age com muita celeridade para condenar o "embargo norte-americano" a Cuba, mas insite em fazer vista grossa para um embargo inúmeras vezes pior. Aquele que é imposto pelo maldito regime a seus cidadãos. O ditador hereditário Raúl utiliza a estratégia das tesouras: enquanto "tolera" que alguns blogs novatos divulguem as mazelas da Ilha e até permite manifestações públicas. Enquanto vende a ilusão de que está começando uma abertura política, continua a governar a ilha com mão de ferro esmagando a verdadeira oposição. Em outras palavras: Cuba nunca foi tão castrista!
No dia 10 de novembro a Rede emitiu uma nota de imprensa informando do jejum e explicando seus motivos. Preferi traduzi-la abaixo para que seja lida na íntegra e para que se conheça o que é DE FATO ser perseguido por ter idéias diferentes e ter a ousadia de se crer um cidadão livre como qualquer outro filho de Deus. Divulguem, para que todos possam conhecer aquela realidade omitida, escondida, negada, menosprezada.
JEJUM VOLUNTÁRIO - NOTA DE IMPRENSA
Os membros da Rede Cubana de Comunicadores Comunitários, resistentes na casa situada em 36, nº 105, entre 41 e 43, Nuevo Vedado, para exigir seus direitos e os do povo, infringidos por um governo que detém o poder, queremos dar a conhecer que a Polícia Política, mão negra da ditadura totalitária, intensificou com seus controles sobre as únicas duas linhas de possibilidade de pequenos fornecimentos que tivemos em todo este tempo, 33 dias de resistir a repressão, ameaças e intimidações de todo tipo, provados através de fotos, gravações e vídeos, localizáveis na Internet no blog: http://redcubanacc.blogspot.com.
Esta última arremetida tem como objetivo nos render pela fome, já que não puderam dobrar a vontade dos que nos encontramos resistindo. O governo cubano demonstrou uma vez mais seu caráter violador dos direitos do povo, exercendo pressão inclusive sobre pessoas não vinculadas à oposição interna.
Nos próximos dias, este grupo de comunicadores se verá forçado a fazer jejum, o que implica ingerir liquido sem açúcar, utilizando para isso a vegetação do jardim da casa onde se leva a cabo o plantão. É por isso que decidimos - a partir de hoje - começar um jejum voluntário, antes que se submeter aos desígnios do regime.
Alguns dos membros do plantão, devido a suas enfermidades crônicas, não poderão resistir muito tempo a esta falta de alimentos, pelo qual responsabilizaremos o governo cubano pelo que possa suceder nos próximos dias aos membros da Rede que se encontram nesta situação.
Assinam: Elizabet de Regla Alonso Castellanos, Zoila Hernández Diaz, Heriberto Liranza Romero, Yasmany Nicles Abad, Yuniet Reina Hernández, Armando Rodríguez Lamas, Martha Beatriz Roque Cabello y Lazaro Yuri Valle Roca.
Cidade de Havana, 10 de novembro de 2009.
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