28 julho 2009

O IPEA de Pochmann

por Thiago Nogueira

O IPEA - fundação federal que tem por objetivo fornecer "suporte técnico" ao governo para avaliação e formulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento – está realizando uma pesquisa sobre as políticas culturais empreendidas pelos ministros da Cultura entre os anos de 1985 e 2009. A pesquisa consiste em um questionário com dez perguntas sobre a experiência dos entrevistados na área de gestão cultural.

Para quem não sabe, o IPEA é dirigido por Marcio Pochmann, professor da Unicamp (paraíso dos "estruturalistas" cepalinos) e petista de carteirinha. Nos últimos anos o instituto se tornou uma espécie de organismo subordinado às pretensões governistas do presidente Luis Inácio Lula da Silva.

Minúcias à parte, o que me chamou a atenção foi a resposta de Ipojuca Pontes a uma das perguntas do questionário. Ipojuca foi secretário nacional de cultura no governo Collor de Mello e foi o responsável pela reforma administrativa que diminuiu a intervenção do Estado na vida institucional do país. Durante a reforma, doze empresas estatais foram fechadas, entre elas a Embrafilme, núcleo de corrupção (também ideológica) na esfera do cinema. Mas, voltando a pergunta do IPEA (e a resposta do Ipojuca)...

A indagação final do questionário era: "No seu período (de gestão) se discutia a construção de um Sistema Nacional de Cultura? Se sim, quais os parâmetros? Se não, por quê?".

Dêem uma olhada no que Ipojuca respondeu:

"Não criei sistema algum, porque só governo de vocação totalitária, ou coletivista, pensa em construção de um 'Sistema Nacional de Cultura'. Senão, vejamos:

1 - Quando, nos anos de 1970, o general Médici esteve à frente do Executivo, propôs um sistema de 'Diretrizes para uma Política Nacional de Cultura', na qual a 'defesa dos nossos bens culturais' era considerada uma 'questão de segurança nacional'. Visando tal objetivo, que reduziu a cultura ao triste papel de mero instrumento de política setorial de governo, os militares também promoveram o seu PAC (Plano de Ação Cultural). Com ele, não abriram mão de gerir, financiar, promover, coordenar e fiscalizar programas, planos e projetos na área cultural, de forma centralizada, praticamente não abrindo espaço para a ação da sociedade.

2 - Com a mesma visão de controle institucional, durante o governo fascista de Mussolini, na Itália, o filósofo Giovanni Gentile, ministro da Instrução Pública, com o seu 'idealismo objetivo' propugnava pela Unificação de um Sistema Nacional de Educação (e, por extensão, de cultura), de cunho corporativista, ao tempo em que propunha, para abrigar um 'Nuovo Rinascimento', a adoção da legenda totalitária 'Tudo para o Estado, nada contra o Estado, ninguém fora do Estado', a ser reproduzida nas capas dos livros, cadernos escolares, museus, etc., e a ser exibida ao público no início de cada encenação das artes representativas.

3 - Joseph Goebbels, ministro da Propaganda e da Comunicação Pública de Hitler, responsável pela sistematização da política cultural alemã, estabeleceu 'Projeto Nacional-Socialista de Cultura' para o Terceiro Reich, cuja proposta era desenvolver entre os povos germânicos os valores culturais da raça ariana, antagônicos aos valores 'sujos' da cultura judaica, dos quais - dizia o ministro - Sigmund Freud era um dos expoentes.

4 - Já na União Soviética da Era Stalinista, Andrei Djanov, sistematizador da política cultural comunista, era o ideólogo do 'realismo socialista' a teoria (na realidade, doutrina oficial) que tinha como principio comprometer o pensamento e a produção artística com a 'transformação ideológica e a educação dos trabalhadores para a formação do espírito socialista'. Jdanov, entre 1936/1938 um dos responsáveis na URSS pela política de extermínio em massa do Grande Terror, na qual foram assassinadas mais de um milhão e meio de pessoas (entre os quais milhares de artistas, intelectuais e bolcheviques dissidentes), tinha como objetivo o controle total da criação artística, para o qual propunha planos, metas e regras. Uma delas, imposta pelo Komintern e aceita pelos PCs em todo mundo, inclusive o do Brasil, figurava o banimento nas manifestações artísticas dos 'vícios da ambigüidade, da ironia, do subjetivismo, das abstrações e do formalismo' - todos considerados 'arcaísmos do degenerado comportamento burguês'.

5 - Em Cuba, Fidel Castro, fiel seguidor dos postulados estabelecidos por Djanov, que tinha como tarefa ideológica a 'ofensiva sistemática contra o imperialismo norte-americano', transformou as instituições culturais da Ilha em aparatos de guerra contra o capitalismo. Em 1971, em discurso público, para manter intacto o seu regime totalitário, ainda hoje reinante, o ditador cubano tornou claro aos intelectuais e artistas presentes qual seria a 'sistemática cultura' a prevalecer em Cuba. À época, Fidel pontificou: 'Dentro da revolução, existe tudo; fora da revolução, não existe nada'. E até hoje a vida cultural da Ilha, explorando ideologicamente as manifestações da criação popular e as atividades artísticas, se limita a praguejar contra o 'imperialismo ianque' e a trovejar loas a uma revolução que sobrevive unicamente por força da violência, do cárcere e do silêncio.

No Brasil moderno, a partir da Era Jango, a construção de um 'Sistema Nacional de Cultura' teve como prioritário, dentro da estratégia traçada por Gramsci nos 'Cadernos do Cárcere', a ocupação de espaços nas instituições culturais do Estado ('aparelho hegemônico'), para fins da promoção da 'revolução passiva', de fundo marxista.

Com breve interregno no Governo Collor - que, por motivos óbvios, não conseguiu levar adiante a sua reforma administrativa -, a estratégia de 'ocupação de espaço' dentro do aparelho do Estado foi vertiginosamente acelerada, em especial no mandato transitório de Itamar Franco e nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, 'intelectual orgânico' por excelência, cultor do 'Estado Ampliado', cuja característica básica - para fins do controle social - é a assunção pelas ONGs (entidades, em geral, de esquerda) das tarefas tidas como próprias do Estado.

Com a chegada do PT ao poder, partido marcado pela teoria e prática leninista, às sutilezas ideológicas tucanas (de natureza gramscistas) foram agregadas ações mais ortodoxas no aparelhamento do Estado, transformado num apêndice do próprio PT - o novo Príncipe Moderno.

No Plano da cultura oficial, sempre a contar com os bilhões de reais das empresas estatais (vide, por exemplo, o caso Petrobras, no momento objeto de CPI), o processo funcional de 'transição para o socialismo' foi acentuado. Subordinado às resoluções anuais do Foro de São Paulo, entidade fundada por Fidel Castro e Lula (em 1990) com a finalidade de 'recriar na América Latina o que foi perdido no Leste Europeu', o governo petista promove hoje nos espaços públicos de ensino cursos de artes administrados por 'especialistas' cubanos; investe, valendo-se do dinheiro do contribuinte, milhões de reais em filmes de denúncia social e propaganda; financia a produção de shows e peças engajadas; patrocina edições de livros empenhados em acirrar a luta de classes; apóia com largos recursos festivais, encontros, mostras e seminários comprometidos com 'o resgate da nossa popular', para fins de 'conscientização das massas'; disponibiliza polpudas verbas para centenas de ONGs e fundações (tais como, por exemplo, a Perseu Abramo, vinculada ao PT), todas elas voltadas para a difusão da 'ideologia revolucionária' - e por ai vai.

Resultado: em vez da criatividade genuína, voltada para a difusão de valores espirituais universais e permanentes, institucionalizou-se no País a indústria do ativismo cultural, centrada na substituição da obra de arte pela febre do evento 'político-cultural-mediático', de cuja manipulação dependem liberações de verbas públicas, a sustentação do clientelismo da 'casta de serviço' e a expansão da Nomenclatura cultural dentro do aparelho do Estado.

Como conseqüência deste processo intervencionista, adeus às possibilidades de se promover os valores mais elevados da cultura, justamente aqueles que expressam a autoconsciência do homem. No plano do pensamento, em vez de Gilberto Freyre, Miguel Reale, Mario Ferreira dos Santos, Sergio Buarque de Holanda, Vianna Moog, Otto Maria Carpeaux ou Guerreiro Ramos, por exemplo, agora temos Emir Sader, Adauto Novaes, Marilena Chauí, Chico de Oliveira e Frei Beto. No plano da criação literária, substituindo Machado de Assis, Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Érico Veríssimo, Marques Rebelo e Nelson Rodrigues - temos Chico Buarque (romancista), Paulo Coelho, Rubem Fonseca, Milton Hatoum, Adriana e João Falcão.

Qual é a explicação para fenômeno tão avassalador? Por que a intervenção estatal na cultura inibe a expressão da criatividade qualificada e só tem abastardado a percepção do que se convencionou chamar de Espírito brasileiro? Por que o nosso idioma se desintegra e empobrece a cada dia? Por que o estilo de vida do nosso povo não inspira a criação de valores estéticos permanentes e universais? E por que é cada vez mais inexpressiva a relação entre arte e sociedade, banal o produto artístico, supérflua e efêmera a imagem da nação refletida no conjunto das obras oficialmente amparadas?

Na minha visão, exclusivamente pela hipertrofia do intervencionismo, que carrega dentro de si o feto do Estado Totalitário. Como se sabe, a teoria do Estado Totalitário se delineia na crença de que o indivíduo é produto exclusivo do meio social e que ele não passa de mera soma de fatores que agem e interagem na sociedade que o circunda. Na compreensão totalitária, o indivíduo deve tudo ao meio a que pertence e a sociedade onde vive. Ao eliminar a hipótese do livre-arbítrio, e da transcendência do homem, o Estado totalitário (em essência, intervencionista) anula, por meio do seu aparato coercitivo, a integridade do ser individual, aplainando, pela impostação ideológica, o seu poder de criatividade.

De fato, nutrido em fantásticas utopias igualitárias, o Estado Totalitário, cuja essência é o culto ao ser coletivo, institui e amplia o controle sobre o indivíduo, visto admitir que o exercício das liberdades individuais realça a diferença entre os homens. Como é fácil verificar, as diversas formas de controle social não se materializam apenas pela ação do poder de polícia. Por isso, as modernas sociedades de massas, em geral totalitárias, para nivelar os indivíduos, e unificá-los em torno de um só pensamento, procuram construir de forma aberta ou subliminar os 'sistemas nacionais de cultura' - o que, cedo ou tarde, obrigatoriamente, os leva à condição de seres padronizados na engrenagem do Estado Utópico idealizado por monstros.

Eis porque - conclui no meu arrazoado aos pesquisadores do IPEA -, na qualidade de gestor da Pasta da Cultura, no curto período do Governo Collor de Mello, jamais pensei em construir qualquer tipo de 'Sistema Nacional de Cultura'".

E é por aí mesmo! Que o digam Armando Valladares, Cabrera Infante, Reynaldo Arenas e Yoani Ramos. Sob a égide dos regimes totalitários, a arte era tratada como uma ferramenta partidária e a estética era deixada de lado em nome dos interesses do Estado. Foi assim na Rússia de Stalin e na Alemanha de Hitler (como foi muito bem salientado pelo Ipojuca).

O período conhecido como "Realismo Socialista", o Estado perseguiu diversos artistas ligados ao Construtivismo, ao Abstracionismo e ao Suprematismo. Sob o governo de Stalin, inúmeros artistas foram impedidos de exercer o seu ofício sob a acusação de trair a política de estética ofícial do Estado.

Alexander Rodchenko, um dos um dos artistas mais versáteis do Construtivismo, foi obrigado a abandonar a arte abstrata na década de 30 em virtude das mudanças que o Partido Governista implementou nas regras da prática artística. Dali em diante, a obra de Rodchenko ficou restrita a alguns ensaios fotográficos de eventos esportivos e imagens de desfiles militares e outros movimentos coreografados.

O cineasta russo Serguei Eisenstein também teve uma vida marcada pela repressão. Durante o regime stalinista, Eisenstein foi perseguido devido à sua visão do comunismo e à sua defesa da liberdade de expressão artística.

O pintor Kasimir Malievith, mentor do Suprematismo, também não teve uma vida fácil sob o regime de Stalin. Malievith foi proibido de continuar sua pesquisa suprematista (considerada revolucionária por vários críticos e estudiosos da arte ocidental) e terminou os seus dias pintando obras figurativas e realistas. O pintor foi acusado pelo governo soviético de "subjectivismo"; perdeu suas funções oficiais e chegou a ser preso e torturado. Morreu abandonado e na pobreza, em São Petersburgo, em 1935. Apesar de ter recebido funerais oficiais, a condenação de sua obra e do suprematismo foi seguida de um esquecimento que durou décadas. Foi somente nos anos 70 que o pintor obteve algum reconhecimento por sua obra.

Na Alemanha nazista ocorreu um fenomeno similar; sob o comando de Adolf Hitler, os nazistas decidiram banir a arte modernista produzida pelas vanguardas artísticas, especialmente na pintura e na escultura, exibindo suas obras para execração pública nas chamadas "Exposições de Arte Degenerada" (uma espécie de freek show político).

A estética nazista foi aplicada por funcionários do partido NSDAP sob a orientação pessoal de Hitler (o cabo boêmio), que havia sido um artista plástico frustrado em sua juventude. Para o grandiloquente Hitler, a arte deveria criar efeitos monumentais e glorificar a pureza da raça ariana.

Enfim, há várias coincidências entre as cartilhas estéticas do III Reich e do antigo bloco comunista. Ambas limitaram de maneira drástica o número de assuntos que podiam ser legitimamente abordados: a pátria, a natureza, o trabalho, o povo. Nada de abstração, nada de "subjetivismos". Só a velha representação realista. Bons mesmo eram os quadros que mostravam paisagens idílicas, robustos camponeses circulando entre ovelhas, pacatos habitantes de aldeia em cenas prosaicas, esportistas em ação e mulheres nuas no padrão clássico, tão sensuais quanto pedaços de isopor. O operário, um baluarte dos dois regimes, era glorificado em vários quadros. Algumas alegorias eram toleradas, exaltando a coragem e a força populares como na tela Vênus e Adônis, em que o másculo guerreiro empunha a lança e se encaminha para o combate enquanto a mulher se esparrama a seus pés. Retratos de militares e de membros do partidão, sempre em poses nobres, também eram muito apreciados. A pompa e a grandiosidade foram defeitos cultivados com esmero nos dois casos.

Atualmente, os países que produzem cultura de massa seguindo os parâmetros da estética totalitária são a Coreia do Norte, a China e o Turcomenistão. Alguns críticos do presidente venezuelano Hugo Chavez, apontam semelhanças entre as peças de sua propaganda oficial e o realismo socialista. Recentemente a Promotoria da Venezuela apresentou um projeto de lei que prevê pena de até 4 anos de prisão para funcionários de meios de comunicação que divulgarem informação “falsa”, “manipulada” ou “tergiversada” que cause “prejuízo aos interesses do Estado” ou atente contra a “moral pública” ou a “saúde mental” da população. Os crimes são caracterizados como “delitos midiáticos”. Não é preciso ser um gênio para constatar que daí até que o aspirante a Bracaleone começe a se intrometer na produção artística do seu país é um pulo!

Vai ver esses são os moldes do modelo de Sistema Nacional de Cultura propósto por Pochmann e seus acólitos do IPEA.

17 julho 2009

Fazendo jabá

Normalmente, não gosto de publicar textos de otros autores neste blog, mas vez por outra eu me deparo com algo realmente espécial. O texto que publicarei a seguir foi escrito por Klauber Cristofen Reis e publicado, originalmente, no site Midia Sem Mascara:

A educação livre da marca da Besta

Inspirado no artigo "A Marca da Besta: A Educação do Futuro", de Julio Severo.

"[A Besta] obrigou todas as pessoas, importantes e humildes, ricas e pobres, escravas e livres, a terem um sinal na mão direita ou na testa. Ninguém podia comprar ou vender, a não ser que tivesse esse sinal, isto é, o nome [da Besta] ou o número do nome [dela]". (Apocalipse 13:16-17 BLH)

Sou um dos raros casos de pessoas que alcançam a maioridade antes dos vinte e um anos, eis que me formei, aos vinte, em curso de nível superior, como oficial da Marinha Mercante. Logo depois da minha formatura eu já comecei a trabalhar e, aos vinte e um anos, casei-me com o amor da minha vida, com quem permaneço até hoje. Este fato ressurge em minhas lembranças como uma espécie de privilégio após ter lido - e constatado - as palavras certeiras do artigo de Julio Severo, "A Marca da Besta: A Educação do Futuro".

Com efeito, no seu texto, o articulista pró-familia evidencia o drama dos adultos jovens cristãos que, no auge da vitalidade, e tendo de estudar por anos a fio em busca da independência financeira, vivem o drama de ter de optar entre a abstinência sexual até o dia do casamento ou entregar-se antes dele.

A nossa abordagem procura dar um complemento, à luz do liberalismo econômico, a esta realidade que poucos hoje enxergam, mas que pode estar contribuindo decisivamente para a decadência de nossa sociedade. Como tenho escrito em outros artigos anteriores, a educação formal brasileira - na verdade de todo o mundo atual - acumula disciplinas as mais das vezes absolutamente inócuas para a formação de um indivíduo.

Quando eu era aluno do nível médio, eu era excelente em Química Orgânica: causava-me orgulho em declamar a fórmula da gasolina, assim como toda sorte de ligações covalentes, benzenos e fenóis. Hoje, à beira dos quarenta, constato que tudo aquilo não de serviu de absolutamente nada! Ora, se nem nas usinas petrolíferas é necessário saber a fórmula da gasolina para produzi-la, mas sim o seu processo de produção, será que os então organizadores do currículo esperavam que eu fosse produzi-la na minha garagem para a vender?

Do primeiro ano do meu curso de Direito, constatei que, de vinte disciplinas ministradas naquele período, apenas duas - isto mesmo - apenas duas (!) tinham alguma serventia. Analisando friamente, gastei um ano de minha vida a estudar assuntos que em nada me interessavam, assuntos sobre os quais inclusive mantenho discordâncias, e gastei nisso uma boa quantia em dinheiro, só porque - e só porque - era o estado quem queria que eu os estudasse.

Há quem venha defender que tais cursos sejam importantes para uma formação ampla e cidadã de um advogado, neste caso, ou de qualquer outro bacharel. Bobagem! Certo é que o domínio de conhecimentos gerais seja importante para qualquer pessoa, e que tanto pode se sair melhor profissionalmente quem os detenha. Contudo, estes conhecimentos podem ser consolidados no decorrer da vida e buscados espontaneamente em fontes especializadas; ademais, a presença de tais cursos nos currículos escolares e superiores tem muito mais a ver com reservas de mercado de trabalho, agregação de valor ao produto por parte das instituições de ensino e principalmente, ao projeto do estado, no sentido de doutrinar as pessoas a fazerem o que ele quer que elas façam, o que, segundo a pertinente interpretação bíblica de Julio Severo, significa carregarem "a marca da besta".

As reservas de mercado dizem respeito aos profissionais que obtém vagas de trabalho por força de lei. Longe de prestarem um serviço voluntariamente contratado pela população, isto é, de oferecerem algo que as pessoas naturalmente procuram para satisfazer às suas necessidades mais urgentes, usaram do estado, por força de lobbies, para obrigar instituições de ensino a ministrar os cursos em que se formaram. Isto aconteceu recentemente com os cursos de Filosofia e Sociologia, por exemplo.

No texto de Severo, há uma referência ao fato de o mercado exigir qualificações cada vez mais complexas como condição de admissão. Embora tenha dito uma verdade, é preciso aqui fazermos uma análise criteriosa: o mercado não exige diplomas; o mercado exige competências. O problema é que é o estado quem exige, por lei, que determinadas empresas contratem determinadas profissões. Assim é que uma empresa com mais de duzentos empregados precisa contratar um nutricionista, por exemplo, ou uma empresa de administração de condomínios precisa contratar um administrador ou uma drogaria, um farmacêutico. Quando não há uma exigência explícita em lei, as competências estão insertas dentro de currículos abusivamente inchados.

Dentro de um regime hipoteticamente livre de mercado, naturalmente os melhores empregos restariam justamente aos mais capacitados. Isto é justo, na medida em que estas pessoas, ao fazerem as suas escolhas, também se submeteram a sacrifícios pessoais maiores do que a média dos seus concorrentes. Todavia, sempre haveria condições de emprego para as pessoas medianas, desde que as proibições de contratar ou a limitação ao exercício deste direito seriam inexistentes por parte do estado.

Daí concluir que o excesso de profissionais desempregados nunca foi um problema criado pelo mercado. Com o deságüe anual de dezenas de milhares de novos profissionais pelos cursos superiores mantidos pelas universidades públicas (e agora por instituições privadas subvencionadas por dinheiro público) em número divorciado e muito superior à emergência de empreendimentos econômicos, era natural que houvesse um contingente de não-empregados. Estes desempregados, logrados por falsas expectativas criadas pelo estado, provocaram a demanda política por alocações compulsórias no mercado de trabalho, e é por isto que pagamos mais caro por cada produto que adquirimos ou serviço que contratamos.

A marca da besta, aqui, também se constata de forma categórica por meio dos chamados conselhos de classe ou ordens profissionais, instituições sobre as quais também já escrevi a respeito, e que decidem quem é que pode ou não trabalhar.

O aumento do valor agregado ocorre por conta da situação de superioridade da instituição de ensino formal face ao indivíduo, já que esta detém a delegação de fornecer-lhe um diploma. Antigamente, em um mundo mais livre, uma pessoa estudava para adquirir conhecimento, para com ele oferecer um serviço mais eficiente e satisfatório aos seus semelhantes. Isto significava que esta pessoa, em geral, já se encontrava inserta em um ambiente de trabalho qualquer, e que procurava estudar objetivamente aquilo que interessava ao seu mister, sem desperdício de tempo ou de dinheiro. Atualmente, em via contrária, as pessoas não estudam para adquirir o conhecimento de que sentem necessidade, mas para tão somente obterem o direito de trabalhar! Trabalhar tornou-se não mais um direito inerente à pessoa, mas uma concessão do estado, do qual se torna refém o indivíduo, desde que ele tem de se submeter ao inchamento da grade curricular convenientemente e lucrativamente estipulada pelas instituições formais de ensino, se é que quer sair dali um dia com um diploma na mão.

Por fim, e principalmente, vem o interesse estatal, que ocupa a maior parte da grade curricular para doutrinar o estudante segundo a vontade da sua burocracia e segundo a ideologia da sua deificação e da anulação do ser humano. O aborto e a eutanásia entram bem neste esquema, desde que seja demonstrado que fetos e velhos doentes valham como engrenagens não desejadas ou já gastas, que não têm serventia à máquina. Controlar a natalidade e a mortalidade é uma necessidade para o estado, já que é ele quem controla também a produção, o emprego e o consumo e é ele também quem se encarrega de pagar a previdência e a saúde. Logo, é necessário evitar que pessoas novas nasçam em um mercado de trabalho para o qual ele não tenha criado novas vagas, bem como é preciso economizar recursos com aqueles que já não têm nada a contribuir.

Possivelmente muitas pessoas que tenham lido o que jaz acima procurem, mediante um esforço sadio e bem-intencionado de raciocínio, criticar as minhas posições. Contudo, vejam: por acaso, os maiores empresários do país necessitaram de um diploma de administradores para construírem seus impérios econômicos? E quanto aos maiores jornalistas, tiveram de obter o canudo previamente? E os maiores filósofos e inventores que a humanidade já conheceu, também passaram a vida sentados em bancos escolares?

Estas são provas concretas de que uma educação liberal é capaz de fornecer profissionais mais capazes, com uma notável economia de recursos e alocação dos profissionais no mercado de trabalho, de modo que se formem onde sejam necessários, e principalmente, que possam construir a vida privada logo no início da vida adulta.

Tente, por um minuto, cair em si para perceber o colossal desperdício que é manter improdutiva toda esta população estudantil que já poderia estar trabalhando desde os dezoito anos de idade ou até ainda mais cedo. Na melhor das hipóteses, uma pessoa se forma em um curso de nível superior aos vinte e três, e às vezes não pega o seu diploma até os vinte e sete ou vinte e oito anos. Considerado o tempo até que consiga seu primeiro emprego e o que é ainda mais difícil, consiga alguma estabilidade financeira, teremos um quadro normal de completa improdutividade que não raro beira os trinta anos de idade.

Ocorre que, nesta idade, a fertilidade das mulheres já começa a experimentar uma sensível diminuição, e isto explica em boa parte a baixa taxa de natalidade que hoje assola a Europa e até o Brasil das classes rica e média, com um sério perigo para o desaparecimento da sociedade, a começar por quem seria a elite que teria o dever de conduzir o restante da população mediante o exemplo e o empreendimento.

Em um regime de educação livre, as pessoas poderiam começar a trabalhar desde o início da adolescência, e ir assim conciliando paulatinamente a prática com a teoria, e aprofundando seu conhecimento com cursos livres. Dizer que adolescentes poderiam e mesmo deveriam trabalhar não é nada imoral, antes o contrário: grandes homens se formaram no aprendizado real que o mercado lhes apresentava. Aos seus dezoito ou vinte anos, eram pessoas responsáveis, habilidosas, seguras e confiantes, em muito diferentes dos pseudo-doutores de hoje que saem das cátedras sem saber como se aperta um parafuso, como se redige uma petição ou como se faz uma sutura.

Além disso, tais pessoas são mais imunizadas contra as teorias espúrias que o estado lhes tenta imputar, justamente porque aprenderam a ser pragmáticas e a confrontar a teoria com a prática. No ensino atual, interessa ao estado que esta conciliação não se opere, desde que este sabe o quanto são disfuncionais.

Quer o leitor uma evidência muito clara da dissociação entre o ensino formal e a função que este exerce para a sociedade? Olhe em torno das faculdades e me diga o que você vê: por acaso enxerga livrarias, sebos, ou empresas de tecnologia de ponta? Não, é claro! O que você enxerga são barzinhos, não é? Dezenas deles! E algumas máquinas reprográficas também! Este é um sintoma muito decisivo para demonstrar que as pessoas não estão com a cabeça nos estudos; não almejam os estudos como uma meta; estão ali é à espera do canudo, cumprindo as formalidades. De certa forma, elas agem de uma forma racional: fingem estudar para um sistema que finge lhes ensinar. Não raro, professores que bebiam nos bares adjacentes à minha faculdade vinham dar aula com sintomas de influência alcoólica, e voltavam aos copos após o cumprimento dos seus horários, junto com os demais alunos cabuladores. Ao fim de um curso, é mais provável que um acadêmico adquira uma cirrose do que algum conhecimento sobre a área em que pretende atuar.

Note o leitor como a educação formal faz com que tantas quantas figuras passem a decidir o que você tem de estudar, exceto o primeiro interessado, que, ora bolas, era pra ser você mesmo! Não é para menos que seus estudos formais atendam antes os interesses destas entidades do que os seus próprios.

A esta altura, alguns leitores poderão, atônitos, perguntar se defendo, por exemplo, que alguém sem o diploma de engenharia se ponha a assinar a planta de um edifício. Daqui afirmo: é isto mesmo o que digo, desde que seja mantida a condição essencial de que, em um regime de máxima liberdade, também tenha lugar a máxima responsabilidade. Em um regime de máxima liberdade e máxima responsabilidade, uma empresa há de contratar alguém que saiba construir um edifício, e não alguém que apresente um diploma que afirme ser engenheiro aquele que só aprendeu a construir "uma sociedade mais justa e solidária segundo Karl Marx" entre um copo e outro no bar ao lado da faculdade. Ela vai fazer isto porque, caso seu edifício caia, há de pagar por todo o prejuízo causado. Pois aqui pergunto: as vítimas do edifício Palace III já receberam as suas indenizações? Dos casos de negligência médica apresentados nos jornais, quantos destes profissionais tiveram o registro cassado? E quanto aos advogados que passaram trapacearam seus clientes, quantos?

Tenha-se claro aqui que não defendo a lulice como exemplo de comportamento. Defendo como ninguém que os jovens se preparem mediante o estudo sério, objetivo e comprometido. Porém, isto está muito longe de se alcançar por via do sistema de ensino formal.


Por que a liberdade assusta tanto?

por Thiago Nogueira

Há poucas semanas o STF revogou a exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista, uma excrescência imposta pela ditadura em 1969 com o intuito de controlar com mais rigor a divulgação de informações. Esse decreto de 69, não obstante tenha sido criado pelos militares para proteger seus próprios interesses, acabou agradando aos comunistas - que assim finalmente conseguiram proibir a livre expressão de ideias - e aos corporativistas da classe jornalística - que agora podiam repousar sobre seus diplomas sem preocupação alguma com a concorrência ou com o fornecimento de serviços de qualidade.

Não se trata aqui de elogiar a ação do governo. Afinal, o Estado simplesmente retirou um empecilho - ou regulamentação, se preferir - que sequer deveria estar ali. É como se o Congresso votasse uma lei aprovando a regulamentação de blogs, dizendo que só pode criar um blog um indivíduo com curso superior em determinada área. Derrubar tal idiotice seria apenas um ato de correção.

Porém, como era de se esperar, a guilda foi às ruas protestar em defesa de sua reserva de mercado. Sob a atual legislação brasileira, qualquer diploma é justamente isso: a garantia de uma reserva de mercado. Falaremos sobre isso mais adiante.

Estudantes, professores e graduados em jornalismo ameaçaram protestar queimando seus diplomas, pois "estavam se sentindo desprestigiados pelo governo". Mas os reais motivos do esperneio são dois: 1) a perda da reserva de mercado e o concomitante aumento da concorrência; e 2) a sensação de terem sido enganados pelo governo.

A primeira razão, embora moralmente condenável, é compreensível. Afinal, as pessoas simplesmente não gostam de concorrência. Se você é o dono da única padaria do seu bairro, você ficaria muito preocupado se algum concorrente abrisse outra padaria perto da sua. Caso fosse possível, você faria de tudo para impedir que esse concorrente se estabelecesse ali, roubando sua clientela. Em um livre mercado, você tem duas armas com as quais lutar contra seu rival: ou você diminui seus preços ou você melhora seus serviços. No extremo, você pode escolher uma combinação dos dois. O que é garantido é que nesse cenário quem se beneficiaria seria o consumidor - o verdadeiro patrão em um livre mercado. Qualquer empreendedor que queira ter sucesso no livre mercado sabe perfeitamente bem que isso só será possível caso ele trate seu patrão, o consumidor, com bastante consideração. Aliás, essa é a beleza do livre mercado. Não importa se o sujeito é o empregado de uma empresa ou se ele é o dono dela: no final, ambos têm o mesmo patrão, o consumidor; e a ele devem gratidão e trabalho duro, como qualquer empregado deve a seu patrão.

Porém, em um mercado regulamentado, sempre existe a opção mais fácil: correr para o governo e utilizá-lo como meio de coerção para impedir a concorrência. A obrigatoriedade do diploma - para qualquer profissão - faz justamente isso. Após 4, 5 ou 6 anos de faculdade, você imagina que, uma vez obtido o canudo, o futuro será brilhante. Nada de se preocupar com a concorrência dos "lá de baixo", aquela casta ignorante e inferior que se diz culta. De agora em diante, você é um ser diferenciado. Aquele canudo vai-lhe abrir todas as portas e garantir bons proventos. Daqui para frente, você passará a crer que as pessoas que não passaram pelo mesmo processo que você deveriam ser proibidas de ofertar o mesmo serviço que o seu.

Desnecessário dizer que a livre concorrência não apenas é algo eficaz e saudável, como também é, do ponto de vista moral, um arranjo intrinsecamente superior a qualquer outro. E isso é assim desde tempos imemoriais - basta ler o episódio bíblico de Marta e Maria (ou mesmo o de Esaú e Jacó). Portanto, por se tratar de um processo antigo e extremamente natural, qualquer tentativa de coibi-lo não tem como resultar em um arranjo mais salutar para todos. Sempre alguns poucos privilegiados irão ganhar em detrimento dos vários outros desafortunados. É assim que se criam "as desigualdades sociais", se for para usar um termo mais populista e bem na moda.

Já o segundo motivo do esperneio - o fato de essas pessoas terem se sentido enganadas pelo governo - é mais complexo. De certa forma, elas estão corretas. O governo, ao decretar que você é obrigado a ter um diploma para trabalhar em determinadas áreas, está de fato obrigando-lhe a cursar mecanicamente alguma faculdade. As pessoas hoje não buscam um curso superior porque estão atrás de cultura (o que, aliás, dificilmente encontrarão em uma universidade); elas buscam o ensino superior justamente porque o Estado decretou que elas só poderão trabalhar em troca de um bom salário se tiverem obtido algum diploma em uma área qualquer.

Faça o leitor uma pesquisa informal: observe as pessoas bem sucedidas à sua volta. As chances de elas estarem trabalhando em uma área diferente daquela em que elas se formaram são enormes. É raro encontrar uma pessoa bem sucedida - isso é, que goste daquilo que faz e que viva bem em decorrência disso - que trabalhe justamente naquilo em que se formou.

Ou seja: o Estado impôs a perda de tempo e dinheiro em detrimento do aprendizado verdadeiro. E o pior: deixou a atual geração tremendamente mal acostumada, pois eles começaram a exigir "direitos" que só existem em suas cabeças.

Funciona assim: o Estado determina que você tem de ter um diploma caso queira seguir uma determinada carreira. Você, então, passa a ser obrigado a perseguir um curso superior. Inevitavelmente serão entre 4 e 6 anos de bons momentos, festas, muita farra e inúmeros porres. O seu objetivo é apenas ser aprovado nas matérias (em sua maioria, inúteis) e pôr as mãos no sonhado diploma. A esperança é que, dali pra frente, o futuro será promissor, uma vez que sua reserva de mercado estará garantida. E então o futuro chega e - surpresa! - a coisa não é nada auspiciosa. Todas as regulamentações e tributações governamentais criaram um mercado de trabalho rígido. Você, no máximo, encontra um emprego que paga um pouco melhor que um estágio, porém que exige muito mais; e, na maioria das vezes, você descobre que não é bem aquilo que queria. Você se sente enganado. Começa então a gritar por "direitos". Começa a achar que, só porque cursou faculdade e tem um diploma, tem "direito" a emprego e salário bons. Porém, assim como você, há vários outros na mesma situação. E o mercado de trabalho é regulado demais para conseguir absorver toda essa mão-de-obra. Solução: você tenta encontrar maneiras de restringir o acesso da concorrência não diplomada. A maioria desiste e vai tentar concurso público - afinal, o indivíduo reage a incentivos; e os incentivos salariais do setor público são tentadores demais para ser rejeitados.

No caso dos estudantes de jornalismo, a decepção é maior. Além de um mercado com poucas vagas, eles perderam a reserva de mercado que o Estado havia lhes prometido - que, em última instância, foi o que os levou a investir tempo e dinheiro nesse curso. Aqueles que estudaram em faculdade particular, então, foram ainda mais prejudicados. Além dos dois contratempos acima, também tiveram de custear seus estudos.

O que praticamente ninguém - independente do curso que faz - ainda entendeu é que, a partir do momento em que um bem (educação superior) é decretado obrigatório pelo Estado, tem-se o cenário perfeito para a formação de cartéis. E o que temos no Brasil é isso: um cartel universitário mantido pelo Estado. O serviço de educação superior - ao contrário de um restaurante, por exemplo - tornou-se algo obrigatório. Você só se torna alguém se tiver perdido no mínimo quatro anos de sua vida sendo imbecilizado por aqueles estabelecimentos chancelados pelo Estado. As universidades não precisam se esforçar para conseguir atrair alunos. Elas sabem que, de um jeito ou de outro, eles terão de procurá-las. Agora então com a expansão do ProUni a situação ficou ainda melhor para elas. O lucro é garantido, mesmo que os serviços prestados estejam em queda livre. Não há a disciplina imposta pelo livre mercado - aquela disciplina que garante a qualidade da comida dos restaurantes.

É por isso que está errada a discussão que alguns pretensos liberais gostam de travar sobre a privatização de universidades públicas. A discussão não deve ser sobre universidade pública versus universidade privada. De maneira nehuma! Os reais defensores da liberdade devem defender o fim da obrigatoriedade do diploma para o exercício de qualquer profissão. Fazendo isso, a imensa maioria dos cursos universitários perderá seu sentido. Ninguém vai perder tempo e dinheiro sendo doutrinado e estupidificado em cursos de ciências humanas, por exemplo. O diploma será apenas um acessório adicional, que pode ou não fazer a diferença. Hoje, com a quase universalização da internet, qualquer um está preparado para estudar por conta própria, desde que tenha força de vontade para tanto.

Cursos que exigem aulas práticas, como engenharia, medicina, odontologia, agronomia e veterinária continuariam sendo ofertados privadamente por universidades. A concorrência entre elas garantiria preços baixos e alta qualidade de ensino. Nada impediria também que profissionais experientes e já treinados pelo mercado oferecessem cursos particulares em determinadas matérias de determinadas áreas. Por exemplo, se um indivíduo está estudando engenharia de forma autônoma e está enfrentando dificuldades em análise estrutural, ele pode procurar especialistas no assunto para sanar suas dúvidas, sendo que esses especialistas - justamente por estarem em busca do lucro - teriam de ter instalações adequadas para ministrarem suas aulas. Esse arranjo seria perfeitamente organizado pelo mercado, da mesma forma que pessoas que querem aprender mandarim procuram centros especializados no ensino do idioma.

"Ah, mas esse cenário seria uma catástrofe! Na ausência da obrigatoriedade do ensino superior, teríamos cirurgiões operando pessoas sem diploma, engenheiros construindo pontes e edifícios sem nenhum preparo e dentistas manuseando perigosamente seus boticões! Imagina o perigo!"

Em primeiro lugar, é bom deixar claro que pessoas diplomadas também cometem erros crassos, principalmente em medicina e engenharia. Em segundo, as pessoas que querem seguir essas áreas podem sim obter um diploma e utilizá-lo como diferencial no mercado. Mas nada impediria que os não diplomados também tentassem mostrar sua competência. A chave de tudo, mais uma vez, chama-se concorrência. É isso que determinaria a qualidade dos serviços. Ademais, as próprias entidades de classe poderiam - no interesse da defesa de sua própria imagem - criar registros com os nomes das pessoas de fato capacitadas para determinados serviços. Seria do interesse dela fazer com que os profissionais da sua área fossem os melhores. Afinal, um profissional ruim mancharia toda a reputação da classe. Essa solução privada já existe hoje em várias áreas - a Microsoft solta certificados de qualificação de programação que o mercado exige; a SAP também. Da mesma forma, o CREA e seus concorrentes provavelmente teriam de instituir certificações para engenheiros, arquitetos, etc. Na área médica, hospitais e empresas de seguro saúde também seriam forçadas pelo mercado a instituir suas certificações próprias.

Sim, hoje existem os conselhos federais. Porém, estas são também entidades coercivas, pois utilizam o Estado para impedir justamente os não diplomados de exercerem sua profissão.

Já aqueles cursos "puramente teóricos", como filosofia, direito, economia, psicologia, ciências sociais, matemática, estatística, história, geografia, física, fonoaudiologia e até mesmo ciência da computação, dificilmente seriam ofertados em grande escala como são hoje, pois não é necessário ter um exército de professores cuja única função é escrever no quadro e indicar livros-texto. Não haveria demanda para um serviço tão básico. Os interessados poderiam perfeitamente se virar para conseguir a educação necessária, seja através de cursos particulares, seja através do autodidatismo. De novo: com a expansão da internet, o indivíduo não tem desculpa para não ser capaz de montar sua própria bibliografia.

Há também o fato de que a maioria das pessoas hoje freqüenta universidades sem ter a mínima noção do que querem. Estão lá ou porque são obrigados ou porque a educação é "gratuita", no caso das universidades públicas. Dinheiro público e recursos escassos estão sendo desperdiçados em pessoas que estão lá apenas para matar o tempo e farrear - tudo por causa de uma estúpida imposição estatal. E mesmo para as que se formam, fica a pergunta: formaram-se em quê? Muito provavelmente ganharam um diploma para nada, pois dificilmente a universidade fornece o treino necessário exigido pelo mercado. O indivíduo fica lá por anos e sai sem saber fazer absolutamente nada de prático. Seria muito mais lucrátivo e eficaz se essas pessoas abandonassem a universidade e fossem trabalhar direto na área de que gostam. O aprendizado seria muito melhor, mais rápido e mais proveitoso. No caso específico do jornalismo, não é raro ouvirmos relatos de um foca que aprendeu mais em três meses de redação do que nos quatro anos do curso.

Finalmente, outro empecilho que deve ser abolido é a proibição do homeschooling (o ensino em casa). É do ambiente familiar que nasce o genuíno impulso para a educação; se os pais não conseguem estimular seus filhos para tal, não serão os burocratas do Ministério da Educação (que, em última instância, são quem determinam os currículos) que o farão. Educação é uma conquista pessoal e ninguém se educa por mera obrigação, contra a própria vontade e sob pressão externa. Com o homeschooling, as escolas, principalmente as particulares, ficariam mais vazias. Essa queda na demanda levaria a uma queda nos preços, possibilitando a matrícula de alunos filhos de pais menos endinheirados. Vale deixar claro que as mensalidades escolares são caras hoje porque as escolas também são um serviço que foi tornado obrigatório pelo Estado. Se um serviço tem demanda obrigatória, é natural que os preços subam constantemente. Liberando-se o homeschooling, as escolas teriam de concorrer mais entre si em busca dos alunos remanescentes. Maior concorrência é igual a preços menores e serviços melhores.

Enfim, haveria várias maneiras de o mercado fazer uma triagem, passar um pente-fino, nos pretensos profissionais de cada área. O que se pode garantir é que, sem o protecionismo estatal, tal seleção seria muito mais eficiente que a atual. Como Lucas Mafaldo explicou:

"Não é preciso provar a importância da competição. Quando abrimos as portas de entrada de um mercado, abrimos também a porta para a inovação e produtividade. Sem a proteção do Estado, os empreendedores precisam competir para melhor servir o cliente, e melhorar o processo de certificação, o que invariavelmente passa por uma combinação de dois mecanismos: melhorar a qualidade do serviço e baixar seu custo.

Remover a obrigatoriedade do diploma para o exercício de determinadas profissões abriria a porta para os diplomados competirem com os não-diplomados. Isso forçaria os portadores de diploma a mostrar resultados, impedindo-os de descansar sobre seus títulos. Isso também criaria um incentivo para os alunos escolherem apenas as universidades que realmente os preparassem para o mercado de trabalho de trabalho. As universidades teriam um incentivo para cortar toda a 'gordura' de seus currículos, deixando apenas aquilo que realmente aumentasse a eficiência profissional dos seus alunos.

E, principalmente, com o aumento da competição, os consumidores veriam a qualidade dos serviços subirem e os preços caírem. Precisamos de diplomas, mas eles não precisam ser obrigatórios. Se alguém realmente quiser ajudar o consumidor, o primeiro passo é abolir as reservas de mercado criadas pelas licenças dos conselhos profissionais - e a obrigatoriedade do diploma é apenas uma delas".

A pergunta a ser respondida pelos protecionistas: por que a liberdade assusta tanto?

08 julho 2009

A USP continua dando o que falar

por Thiago Nogueira

Acabo de saber que a USP vai repor as aulas perdidas devido a greve dos professores, ocorrida em maio e junho.


As atividades dos 17 dias letivos deverão ser repostas no período de 13 de julho a 7 de agosto. As unidades que precisam repor aulas terão que propor um calendário dentro deste período e o início do segundo semestre será atrasado para 10 de agosto. Os cursos que não aderiram à paralisação vão começar o semestre dia 3 de agosto (sorte a deles).

A paralisação atingiu principalmente os cursos da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas), da ECA (Escola de Comunicações e Artes) e de Pedagogia.

A greve dos funcionários e professores foi encerrada em 30 de junho, mas os estudantes - que durante a greve apoiaram o movimento grevista - votaram em assembleia a continuidade da greve, mesmo no período de férias. O argumento é que as pautas estudantis não foram contempladas nas negociações, como a democratização da universidade, com eleições diretas para reitor.

Eu não sei o que os estudantes da USP que aderiram a greve entendem por "as pautas estudantis não foram contempladas nas negociações", já que a reitoria da faculdade se comprometeu em rever os valores do auxílio-alimentação (de R$ 320 para R$ 400, retroativos a 1º de maio), do auxílio-refeição (de R$ 13 para R$ 15) e do auxílio-creche (R$ 422). Como se não bastasse, foi criado um tal de "auxílio-educação especial", que será pago aos pais e mães funcionários da instituição que têm filhos excepcionais. O valor do auxílio é de R$ 422 e será pago até que o educando alcance a idade de 18 anos.

Quem vai pagar esta conta? Ninguém sabe!

Mas este não é - nem de muito longe - o maior dos problemas. Faz tempo que os sindicalistas da USP consideram que a prioridade da faculdade não são os alunos, mas o Sintusp. Querem privatizar a USP; torná-la mero palco de operações do "movimento revolucionário". Essa é a democracia de Antônio Candido, Marilena Chaui e Fábio Konder Comparato. Para os ilustres acadêmicos da USP, a produção de conhecimento é coisa de universidade reacionária, o que realmente importa é atender aos interesses dos seus funcionários.

06 julho 2009

Projeto que autoriza a educação escolar domiciliar está em perigo no Congresso Nacional

por Thiago Nogueira

Agora há pouco eu tive a infelicidade de ler que o projeto de lei que pretende autorizar a prática do ensino domiciliar no Brasil está correndo um grave perigo no Congresso Nacional.
A deputada Bel Mesquita, relatora do projeto, apresentou parecer rejeitando a educação escolar em casa no Brasil.

O projeto tem o intuito de acrescentar um parágrafo único ao artigo 81 da Lei nº 9.394, de 1996, que institui as Diretrizes e Bases da Educação Nacional e dispõe sobre o ensino domiciliar. Receio que sem uma mobilização urgente da população, as famílias brasileiras perderão um importante direito natural.

O PL-3518/2008, que havia sido originalmente introduzido pelos deputados Henrique Afonso e Miguel Martini, tem como objetivo devolver às famílias brasileiras seu direito natural de atuar na educação dos próprios filhos.

"O direito de educar os filhos em casa não é estranho à cultura brasileira, tendo sido presente nas Constituições do Brasil até 1988, quando constituintes socialistas conseguiram exterminar da realidade brasileira a liberdade educacional que sempre existiu. Em seu lugar, impuseram a frequência obrigatória no estabelecimento escolar, como se a mera presença do aluno na instituição de ensino fosse sinônimo de educação. Se assim o fosse, a mera presença de uma pessoa em uma oficina a tornaria automaticamente um mecanico"!

A atual realidade brasileira, com uma educação estatal decadente e precária, prova o que a falta de liberdade educacional e a burocracia estatal contribuem para o sucateamente progressivo do ensino. Mesmo assim, a mentalidade socialista impõe a burocracia e rejeita a liberdade. É dentro dessa mentalidade que a deputada Bel Mesquita, do PMDB (aliado do governo Lula), apresentou parecer rejeitando o projeto de lei que procura devolver aos pais o controle sobre a educação de seus filhos.

Enquanto o governo, que está fracassando na educação das crianças, está empenhado em derrotar o único esforço parlamentar em defesa de pais aptos que querem educar os próprios filhos, famílias sofrem o peso da injustiça estatal.

Em Timóteo, Minas Gerais, o casal Cleber e Bernadeth Nunes, que educam os filhos em casa, foi submetido à perseguição legal do Ministério Público e do Conselho Tutelar. O juiz responsável pelo processo, chegou a exigir que os filhos do casal fossem submetidos a uma avaliação educacional a fim de comprovar que houve abandono intelectual. Quando a avaliação, feita por meio de provas rigorosas preparadas por professores do governo, resultou na aprovação dos meninos, ao invés de reconhecer a competência da educação domiciliar e cessar as hostilidade contra aquela família, o Estado reafirmou o seu empenho em lutar contra ela.

Em 2001, no famoso caso da família Vilhena, que lutou muito para recuperar seu direito de educar os filhos em casa, o STJ chegou estupidamente a declarar que "os filhos não pertencem aos pais".

Se não conseguirmos resgatar para as famílias brasileiras a liberdade de educar os próprios filhos, restará apenas o "direito exclusivo" do Estado determinar e controlar a educação das crianças. O resultado? Olhem para a história e veja a sociedade nazista e comunista, ideologicamente controladas desde as escolas, onde a educação das crianças era prerrogativa exclusivamente estatal. Precisamos repetir os erros deles?

Tudo o que é necessário para que o mal avance é os bons cruzarem os braços. Por isso, convoco você a descruzar os braços. Escrevam ou telefonem imediatamente ao Congresso pedindo a aprovação do PL-3518/2008, que está na Comissão de Educação e Cultura. Encoraje-os a aprovar o projeto e recupero o seu direito natural de participar - direta e indiretamente - da educação dos seus filhos.